terça-feira, 22 de abril de 2008

Relógio sem ponteiros


Hoje, no caminho de regresso a casa, fui interpelada por uma velha mullher. Tinha a vida vincada no rosto, um olhar perdido. Vestia um casaco comprido, mal abotoado, e segurava com firmeza a mala contra o peito. Encostada a uma parede, parecia temer as pessoas que caminhavam apressadas, ignorando-a. Talvez eu a tenha olhado com ternura, ou o sorriso que inconscientemente esboçei, lhe tenha dado coragem para me falar: - "A menina desculpe...mas sabe que dia é hoje?"
Confesso que a pergunta me surpreendeu, mas logo senti o seu embaraço e angústia. Olhei-a com compreensão e respondi-lhe, quase em surdina, num tom cúmplice, como se partilhássemos um segredo: -"Hoje é 3ª feira, dia 22 de Abril."
Entre palavras de agradecimento e lágrimas enxugadas com um lenço primorosamente dobrado, confessou-me que se esquecia do tempo. E só do tempo.
- "Sou um relógio sem ponteiros..."

Antes de nos separarmos, perguntou o meu nome e prometeu não se esquecer de mim. Talvez já nem se lembre... Eu sei que nunca mais a vou apagar da minha memória. Vai-me sempre recordar que o tempo não pára, mesmo que viva 'adormecida'. E que, mesmo que não queira, os 'ponteiros do meu relógio' vão girar, e girar...e o tempo vai acabar por apanhar-me.

1 comentário:

Freckles disse...

Os ponteiros estão prestes a chegar ao teu tempo de ser feliz amiga, acredita!
Eu cá estarei para contabilizar todos os segundos de sorrisos.
Sempre contigo.
Beijo grande